sábado, 24 de fevereiro de 2024

Amplificadores de áudio classe "G"

Uma análise didática sobre o princípio de funcionamento do estágio amplificador de potência em classe "G", empregados em equipamentos de áudio.

Amplificadores de áudio classe "G"
Amplificadores de áudio classe "G"

Atualmente, a tendência nos equipamentos de som encontrados no mercado é a utilização de estágios de saída com potência cada vez maiores resultando em amplificadores monstruosos que produzem mais calor do que som propriamente dito.

A explicação para tal fato está na necessidade de se obter uma "Faixa Dinâmica" mais ampla, a fim de se conseguir uma boa fidelidade na reprodução dos picos dos sinais de uma "Fonte de Programa".

Faixa Dinâmica (do inglês Dynamic Range) – é o conjunto das amplitudes dos sinais (desde as mais reduzidas até as mais elevadas) que um equipamento de áudio pode manejar, sem provocar distorções.

Fonte de Programa – pode ser entendido como o elemento que fornece um sinal de áudio, em um equipamento de som, como a cápsula fonocaptora de um toca-discos, a cabeça magnética reprodutora de um toca-fitas, o estágio detetor/demodulador de um sintonizador AM/FM, etc.

As técnicas modernas de gravação acentuaram a faixa dinâmica dos discos e das fitas magnéticas, o que tem exigido mais potência dos amplificadores para se obter uma reprodução isenta de distorções por saturação. Pode-se dizer que, nos últimos dez anos, a faixa dinâmica de das gravações aumentou mais de três vezes.

Assim, um amplificador fabricado dez anos atrás, que tinha uma potência suficiente para reproduzir com fidelidade as gravações da época, hoje necessitaria mais do triplo da sua potência para fornecer a mesma qualidade sonora, sem produzir distorções por saturação, o que é totalmente inadmissível e equipamentos de boa qualidade.

A amplitude do sinal fornecido por uma fonte de programa, como sabemos, varia constantemente. Por outro lado, a porcentagem do nível (amplitudes acima de 0,5 do valor de pico) é de apenas 1,4%.

Em outras palavras, o intervalo de tempo em que as amplitudes de um sinal musical ultrapassam metade do valor de pico é somente 1,4% do tempo total de audição. Porém, nesse curto intervalo os picos de potência são essenciais para uma reprodução agradável, e a maioria dos ouvintes os exige.

Amplificadores de grande potência de saída têm sido utilizados convencionalmente para reproduzir os picos dos sinais musicais, sem ocasionar distorção por saturação. Esses aparelhos, via de regra, empregam um estágio de saída em classe "B", onde uma alta tensão CC é aplicada aos transístores de saída, resultando em um consumo de potência elevado.

Como nasceu o amplificador Classe "G"

Tendo em vista os dados apresentados, estudos foram realizados pelos fabricantes de equipamentos de som com o intuito de se obterem altas potências de áudio sem o aumento do consumo dos transístores de saída (melhoria da eficiência), e com uma redução no peso e no volume do transformador de força e dos dissipadores de calor (aumento da compactação).

Desses estudos nasceu o amplificador Classe "G". Ele foi desenvolvido em 1975 pelo engenheiro de áudio Tohru Sampei, do Centro de Pesquisas de Produtos de Consumo da Hitachi, em Yokohama, no Japão.

O diagrama em blocos simplificado da figura 1 nos dá uma boa ideia de como é constituído um sistema de amplificação de áudio que opera em Classe "G".

Diagrama em blocos (simplificado) de um sistema de amplificação em classe "G".
Figura 1 — Diagrama em blocos (simplificado) de um sistema de amplificação em classe "G".

Basicamente ele é formado por dois amplificadores convencionais, em classe "B", um deles de alta potência (AF1) e outro de baixa potência (AF2). Do sinal musical de entrada (forma de onda "I"), o estágio AF2 encarrega-se de amplificar apenas os níveis baixos (forma de onda "II"), enquanto que o estágio AF1 é responsável pela amplificação dos níveis altos (forma de onda "III").

A alimentação é feita por duas fontes balanceadas, uma de alta tensão (B1) e outra de baixa tensão (B2), sendo que essas fontes fornecem tensões simétricas em relação à massa: duas positivas (+B1 e +B2) e duas negativas (-B1 e -B2).

Em resumo, sempre que ocorrerem os picos do sinal musical fornecido pela fonte de programa, o amplificador de alta potência entrará em ação, automaticamente, evitando que o sinal de saída seja distorcido por saturação.

Circuitos básicos do amplificador Classe "G"

Na figura 2 mostramos um circuito básico para análise do princípio de funcionamento do amplificador classe G.

Circuito básico de um amplificador de áudio classe G
Figura 2 — Circuito básico de um amplificador de áudio classe G (semiciclos positivos)

O sinal de áudio (Een), fornecido pela fonte de programa, é aplicado às bases de dois transistores NPN, os quais estão "empilhados" (T1 e T2). O sinal de saída se desenvolve através de um alto-falante, indicado por Zs.

A fonte de baixa tensão (+B2) alimenta o amplificador de baixa potência (T2), através do diodo de bloqueio (ou diodo isolador) D1. Já a fonte de alta tensão (+B1) alimenta diretamente o coletor de T1 (amplificador de alta potência).

Quando o nível do sinal de entrada é baixo (inferior a +B2), o emissor de T1 ficará mais positivo do que a sua base. Por ser do tipo NPN, então esse transistor permanecerá cortado. Por outro lado, o T2 irá conduzir de modo que a corrente elétrica através de Zs será fornecida por +B2 através de D1 e coletor-emissor de T2.

Quando o sinal de entrada atingir os seus níveis altos (picos positivos), o transistor T1 passará a conduzir, e agora a corrente elétrica através de Zs será fornecida pela fonte +B1, via coletor-emissor de T1 e coletor-emissor de T2. Nesta situação, o diodo D1 impede que a tensão de +B1 seja aplicada na fonte +B2, pois ele estará polarizado inversamente.

O circuito básico, apresentado na figura2, opera apenas nos semiciclos positivos do sinal de entrada, porque ele utiliza transistores NPN.

O circuito básico com dois transistores PNP, "complementar" ao que acabamos de analisar, é mostrado na figura 3. Aqui, as polaridades do diodo de bloqueio (D2) e das fontes de alimentação (-B1, -B2) são contrárias àquelas da figura 2.

Circuito básico de um amplificador de áudio classe G
Figura 3 — Circuito básico de um amplificador de áudio classe G(semiciclos negativos)

Para os níveis baixos dos semiciclos negativos do sinal de entrada, T4 ficará cortado e T3 irá conduzir. Durante os níveis altos de Een, então T4 passará a conduzir.

Com os arranjos indicados nas figuras 2 e 3 consegue-se aumentar a eficiência do amplificador, uma vez que os transístores de alta potência são solicitados por um curto intervalo de tempo, isto é, somente durante os picos do sinal musical de entrada. E quando esses transistores entram em ação, eles amplificam fielmente os picos de Een, evitando a ocorrência da distorção por saturação, conforme já foi mencionado.

A distorção por comutação e como reduzi-la

Os circuitos básicos do amplificador classe G, apresentados atrás, possuem uma deficiência. Trata-se da distorção por comutação (ou distorção por chaveamento), a qual se manifesta duas vezes em cada semiciclo do sinal de entrada, ou seja, durante a comutação da fonte B2 para a fonte B1 e vice-versa (figura 4).

Sinal de áudio distorcido
Figura 4 — Sinal de áudio distorcido (distorção por "chaveamento" ou por "comutação"), obtido na saída do amplificador Classe "G" básico

Por exemplo, no circuito da figura 2, o transistor T1 só começará a conduzir quando o nível do sinal de entrada (Een) for superior à tensão da fonte B2 mais a tensão entre base e emissor de T1 (Vbe1). Além disso, quando o nível do sinal de entrada atingir um valor entre B2 e (B2 + Vbe1), o transistor T2 já estará saturado e T1 ainda não terá começado a condução.

Isso resultará em um sinal de saída distorcido, tal como está indicado na forma de onda mostrada na figura 4.

Para reduzir esse tipo de distorção, os circuitos básicos do amplificador classe G devem ser modificados.

A distorção por "comutação" é reduzida pela inclusão do diodo "D4"
Figura 5 — A distorção por "comutação" é reduzida pela inclusão do diodo "D4" (semiciclo positivo)

No circuito da figura 5, por exemplo, foi introduzido um diodo zener (D4) em série com a base de T2. Escolhendo-se adequadamente o valor da sua tensão zener, consegue-se fazer com que T1 comece a conduzir antes de T2 atingir a saturação. No lugar do zener D4 também poderá ser usado um divisor de tensão resistivo, visto que a sua função é proporcionar uma diferença de tensão igual a Vbe1.

No circuito da figura 5 também foi acrescentado um diodo (D3) em série com a base de T1. A sua função é proteger a junção base-emissor desse transistor durante os intervalos de tempo em que ela fica submetida a uma tensão inversa, ou seja, quando Ven for menor do que a tensão da fonte +B2.

A distorção por "comutação" é reduzida pela inclusão do diodo "D5"
Figura 6 — A distorção por "comutação" é reduzida pela inclusão do diodo "D5" (semiciclo negativo)

No circuito da figura 6, o diodo zener D5 impede que T3 atinja a saturação antes de T4 começar a conduzir. Já o diodo D6 protege a junção base-emissor de T4 contra polarizações inversas.

O amplificador de saída de áudio em classe "G"

Finalizando, na figura 7 apresentamos o circuito completo de um amplificador de saída de áudio que trabalha em classe G.

Diagrama esquemático de um amplificador de saída de áudio em Classe "G"
Figura 7 — Diagrama esquemático de um amplificador de saída de áudio em Classe "G"

Os transistores de saída T2 e T3 constituem um par complementar casado, o mesmo ocorrendo com T1 e T4.

Por outro lado, T5, T6, T7 e T8 são os excitadores (ou "drivers") para os transistores de saída.

Pelo emprego de tensões de alimentação simétricas em relação à massa (+B2 / -B2, +B1 / -B1), consegue-se um circuito de acoplamento direto, também conhecido por OCL ou saída sem capacitor de acoplamento para o alto-falante (do inglês, Output Capacitor Less).

No diagrama da figura 7, com o intuito de simplificação, foram omitidos os diodos D3 e D4, bem como D5 e D6, apresentados, respectivamente, nas figuras 5 e 6.

Os valores das tensões de alimentação são, a título de exemplo, 48V para B1 e 20V para B2. Na realidade, teremos: +48, +20V, -20V e -48V.

Tal como foi descrito anteriormente, os transistores T1, T2, T5 e T6 trabalham apenas nos semiciclos positivos do sinal de entrada, enquanto que T3, T4, T7 e T8 operam somente nos semiciclos negativos. Os sinais de entrada de baixo nível são amplificados por T2/T6 ou T3/T7, ao passo que os de alto nível são amplificados por T1/T5 ou T4/T8, conforme o semiciclo.

As setas +I1, +I2, -I1 e -I2, indicam o sentido das correntes elétricas fornecidas pelas fontes de alimentação.

Como já foi mencionado, D1 e D2 desempenham a função de diodos isoladores ou diodos de bloqueio.

Bibliografia

a) Len Feldman, CLASS G — High efficiency HI-FI amplifier, revista Radio Electronics, nº 8, vol. 47, Agosto de 1976, páginas 47, 48, 49 e 87.

b) Spec-sheet HITACHI, Dynaharmony amplification, catalog nº HE-E746.

c) Tohru Sampei Shinichi Ohashi, Yoshihiro Ohta and Shigei Inoue, Highest efficiency and super quality audio amplifier using MOS power FETs in class G operation, IEEE Transactions on Consumer Electronics, vol. CE-24, nº 3, August 1978, páginas 300 a 306.

d) Derek Cameron, Audio Technology Systems: Principles, applications and Troubleshooting, Reston Publishing Company, Inc., 1978.

e) Andy J. Wells, Audio Servicing - Theory and Practice, McGraw-Hill Book Company, 1980.

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